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Fábio |
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Exemplo de Sustentabilidade
Fábio Risério: o “menino” de Capão Redondo que hoje trabalha para que outros tambémtenham um caminho melhor
Em outubro, durante encontro da Associação Brasileira de Facilities (Abrafac), tive o privilégio de assistir a uma palestra do jovem Fábio Risério. Relações Humanas de uma empresa brasileira de desenvolvimento de projetos de infra-estrutura, ele tem apenas 33 anos e o sonho de transformar a vida das pessoas, assim como a sua trajetória foi modificada, para melhor. Se falamos em Sustentabilidade, Responsabilidade Social, ele pode – com propriedade – comprovar o quanto as iniciativas sérias das empresas e mesmo as escolhas certas podem levar o ser humano a transformar o seu mundo e o Planeta. Filho de retirantes do nordeste, ex-morador do chamado “Triângulo da Morte” (região de Capão Redondo, Campo Limpo e Jardim Ângela, na periferia de São Paulo), Fábio é hoje importante protagonista do desenvolvimento social por uma sociedade mais próspera e justa. Então, curioso para conhecer essa história de vitórias?
Quem é o Fábio Risério? Para falar da gente, é preciso contar de onde viemos. Meus pais são retirantes do Nordeste – sertão da
Bahia. Só pra ter uma noção, meu pai tem 23 irmãos, minha mãe tem 17, todos vivos.
Você começou a trabalhar bem cedo, não? Nasci no bairro de Capão Redondo; morávamos em um cômodo. Fui orientado pelo meu pai para seguir a profissão de marceneiro (a terceira geração), e por dois motivos principais houve uma mudança de planos. Primeiro porque eu era péssimo nessa função (risos)... Segundo, porque sempre gostei muito de ler; me aperfeiçoei realmente com os jornais que vinham forrando as madeiras mais delicadas. Meu pai dizia: “esquece, meu filho. Filho de pobre vai morrer pobre”. Mesmo assim, sempre tive vontade de estudar. Quando eu via na televisão aquelas pessoas de paletó e gravata eu achava isso maravilhoso, e sempre dizia para a minha mãe que um dia eu seria um deles.
Mas você não desistiu... Nunca deixei de estudar... Trabalhava durante o dia e ia para a escola à noite. Repeti alguns anos por que era pesado trabalhar nesta profissão. Mas gosto de dizer que sou uma pessoa de sorte, não pelas circunstâncias da minha vida, mas pelas pessoas que estavam ao meu redor, e pelas que ainda iria conhecer. Primeiro os meus pais: os valores que eu trago até hoje não são os que eu li em livros. Mesmo sem saber, eles entendem muito mais de sustentabilidade do que eu: com seus valores, seu caráter. Outra pessoa que fez grande diferença na minha vida: uma professora que via em mim um potencial. Era a única que não reclamava quando eu dormia na aula dela. Ela sempre me incentivou, me dando esperança de que eu poderia ser o que quisesse.
E no colegial? Mantive a mesma rotina, de trabalhar na marcenaria e estudar no período da noite. Uma outra professora (tia Teresinha), que também se identificou comigo, via que apesar das dificuldades eu tirava notas boas. Muitas vezes perdi a última condução da
noite porque ficava depois da aula, tirando as dúvidas. Enxergava que era a única oportunidade para sair daquela condição; só o estudo iria me levar para um caminho diferente. Mesmo assim, um dia, esta professora me questionou sobre qual faculdade eu iria cursar. Eu respondi; “Quê isso! Faculdade, eu?”.
Você nunca teve um sonho, um modelo de alguma profissão? As pessoas mais humildes, quando vêem um engravatado já chamam logo de Doutor. Sempre tive o desejo de dar essa felicidade para os meus pais. Sou o mais velho de três irmãos. A minha irmã do meio é deficiente mental (por erro médico). Essa ques tão social pode até ser uma das explicações porque me enveredei pelo caminho da sustentabilidade. Essas e outras questões foram responsáveis por introjetar em mim a necessidade de, desde pequeno, trazer um orgulho para os meus pais.
E você conseguiu. Foi uma quebra de paradigmas? Com certeza. Na minha família, em todas as gerações, não existia ninguém até então que tivesse um curso superior. E não falo isso como uma crítica. Com todas as dificuldades financeiras, sociais, meu pai nunca deixou faltar nada em casa. Eu digo para ele que, apesar das graduações/especializações que eu tenho hoje, o
que eu aprendi equivale a 10% do que ele me ensinou em termos de conduta de vida – coisas que você não aprende num banco de escola. Ele foi meu grande exemplo.
Mas quando a professora perguntou sobre a faculdade, você não acreditou que seria capaz! Apesar do meu espanto, eu respondi que gostaria muito, mas que não me via nessa condição. Hoje estou trabalhando em um projeto social em Campo Limpo, bem perto de onde nasci. Me vejo naqueles meninos. “USP, Federais, só para rico que teve condições de estudar num colégio melhor”, a gente pensa. “Particulares, só para quem nasceu em berço de ouro. Eu não vou conseguir”, e muitos deles também pensam. Quando tia Teresinha me perguntou se eu queria muito aquilo, minha resposta foi positiva. Vendo minha dedicação e esforço, ela conseguiu uma bolsa de estudos num dos melhores cursinhos de São Paulo. O único pedido: que eu aproveitasse. Imagine: o valor da mensalidade equivalia a uns cinco salários que eu ganhava na marcenaria! Não parei de trabalhar, e foi no cursinho que eu consegui enxergar um mundo que não era meu; uma cultura totalmente diferente. Foi a primeira vez que sai de Campo Limpo. Vendo aquelas pessoas, pensei: estamos no mesmo patamar. Ou seja: aquele sonho que estava tão longe ficou bem mais próximo. Foi aí que eu acreditei que era possível.
E depois? Passei na Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) para fazer Relações Públicas, em Bauru, interior de São Paulo. Foi uma felicidade geral, a primeira vez que o meu pai comprou um jornal, para ver meu nome na lista dos aprovados. Foi aí que eles começaram a acreditar que as coisas podem mudar. Mas aí veio outro obstáculo: como me manter em outra cidade, mesmo não tendo que pagar a faculdade? Não conhecia ninguém. Fui mesmo assim, e meu pai me disse na época, me lembro bem: “Se você for, que seja para ficar”. Foi o mesmo que o pai dele disse quando ele veio para São Paulo. Fui, é claro, com a cara e a coragem, e tive a ajuda de três colegas maravilhosos (Carlão, Malásia e Luisão), que me deixaram ficar na república deles sem pagar aluguel. Em troca, eu fazia trabalhos domésticos. Mas isso não poderia ser para sempre, não é mesmo?
Fiquei lá seis meses quando um dia, andando por Bauru, vi um anúncio na porta de um estabelecimento, que dizia: “Precisa-se de marceneiro” (risos). No dia seguinte, voltei lá, tendo em mente que na vida, para conquistar aquilo que a gente quer, temos que fazer coisas que às vezes não gostamos. Trabalhei lá por seis meses porque no segundo ano da faculdade consegui um estágio na área de Relações Públicas. Foi quando, pela primeira vez, entrei em um escritório, usei terno e gravata. Já foi um grande passo!
Você escolheu Sustentabilidade para o trabalho de conclusão de curso, não? Sim. E por quê? Diante de tantas pessoas diferentes na mesma sala de aula, das oportunidades que eu tive na minha vida até ali – tudo foi um grande aprendizado. Olhar a minha origem me dá muitas respostas para o que fazer no futuro. Foi quando decidi por fazer alguma coisa que pudesse mudar a vida das pessoas. Paralelamente, enxerguei que a comunicação era uma das maiores dificuldades das organizações. Na época, uma revista divulgara “as 100 melhores empresas para se trabalhar”. Aí que veio o “gancho”! “Vou trabalhar na área de Relações Públicas ajudando na qualidade de vida dos profissionais”. Pesquisei o tema... Em 1999, surgia através do Instituto Ethos a Responsabilidade Social. Foi amor à primeira vista. Pensei: “Poxa, ao invés de ajudar não só os profissionais, eu posso ajudar a sociedade inteira”. Como o meu tema de TCC foi a Responsabilidade Social, e a minha orientadora gostou muito do trabalho (olha só de novo a questão com o professor!), ela me perguntou por que não me indicar para concorrer ao “Prêmio Ethos Valor”, promovido junto ao Jornal Valor Econômico, para reconhecer as melhores teses neste quesito.
E você ganhou? Sim. Foi outro marco na minha vida. Depois disso, comecei a acreditar que tudo é possível, quando se quer realmente. Foi uma quebra de paradigmas. Hoje meu irmão mais novo está na faculdade! E outros primos, também. Vi, meio que até sem querer, que virei exemplo para uma família inteira. Quem entregou o prêmio foi o então Ministro da Educação, Paulo Renato. Aí, aquele menino, franzino, que nasceu em Capão Redondo, receber um prêmio do Ministro da Educação, imagina!
Como entrou para o mercado de trabalho? Sempre fui cara-de-pau. Peguei meu diploma e o prêmio, coloquei debaixo do braço e sai em busca de uma oportunidade. Conversando com um profissional de uma empresa de meios eletrônicos de pagamento, descobri que tínhamos a mesma origem humilde. Foi aí que percebi que era importante não usar isso como um artifício, mas sim conquistar as coisas pela minha capacidade. Descobri até que esta pessoa resolveu me contratar, sim, pelo meu potencial, e isso foi importantíssimo para mim. Procuro passar isso para as pessoas, para que elas também possam sonhar e acreditar que têm um futuro pela frente. Hoje dou valor nas coisas mais simples. E isso vale muito a pena, e não esse modelo de sociedade em que a gente vive, que temos que ser melhores em tudo, que o ter vale mais que o ser... Quero, sim, ter qualidade de vida, mas não quero ser o Bill Gates, até porque não é todo mundo que vai ser, e eu falo isso para os meninos, no projeto.
Por quanto tempo ficou nessa empresa? Durante quatro anos. A diretora de RH, na época, assistente social, tinha um grande interesse nos projetos sociais. E ela me disse que eu seria a pessoa chave para fazer isso. Participei de projetos de voluntariado. Foi lá também que aprendi muitas coisas: o que é uma reunião, como me portar no ambiente profissional, como ministrar uma palestra... Depois desses quatro anos, percebi que já havia realizado o que podia. Era hora de fazer mais. Fui então para Curitiba trabalhar em uma ONG de comércio justo (Boutique Solidária). Foi outro aprendizado, pela cidade, por trabalhar numa organização deste segmento. Fiquei lá por três anos até perceber que estava na hora de mudar novamente. Foi quando surgiu de novo na minha vida aquela professora que me ajudou com a bolsa de estudos. Ela estava engajada em um projeto na ONU [Organização das Nações Unidas]. Me disse que o Penude (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) estava com um projeto que tinha tudo a ver comigo.
Qual era o escopo do trabalho? O objetivo era incentivar jovens lideranças sustentáveis. Eu seria o porta-voz das diretrizes do milênio neste sentido – os 10 princípios do Pacto Global. Achei muito bacana, era realmente o que eu queria. Mas eu tinha vinte dias (prazo de inscrição do programa) para encontrar uma empresa que apostasse nesta parceria. O programa subsidiaria 50% do salário e a empresa a outra metade. Foi quando apresentei o projeto à minha atual diretora. O prazo do programa era de um ano. Neste tempo a própria ONU saiu da parceria. Mesmo assim, segurei três meses sem falar nada com receio de que a empresa rescindisse meu contrato. Mas ela, assim que soube, continuou apostando no meu trabalho, pagando integralmente o meu salário, além dos 50% que não foram pagos nestes três meses. Mas a grande oportunidade oferecida foi um curso que pudesse contribuir com o meu trabalho na área social. Cursei então MBA em Gestão Socioambiental (FIA/USP). Nesse dia eu até chorei. Pensando que fosse ser mandado embora, a vida me mostrou outra realidade. Daí para frente as coisas só melhoraram: a autonomia, a credibilidade que me foram dadas... Hoje estou conduzindo projetos importantes, como de voluntariado.
Fale um pouco sobre eles. A empresa apóia desde 2001 a Casa do Zezinho, atendendo crianças e adolescentes das regiões do Parque Santo Antônio, Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luiz. Conhecida pelo alto índice de violência e criminalidade, essa região passou a ter, com o projeto, alternativas de lazer para seus moradores: crianças, adolescentes e inclusive seus familiares. Em todos os finais de semana existem opções de lazer que vão desde apresentações de espetáculos teatrais, cinema, música, literatura, dança, até visitas monitoradas e outras manifestações artísticas e culturais.
O que mais vale a pena ao promover esses projetos? O envolvimento. Uma coisa que aprendi é que dar o cheque é apenas o começo e o mais fácil. É preciso uma interação maior com este público; é aí que está a riqueza. Começamos então a nos aproximar mais dessas entidades. Quando as empresas me pedem indicadores de sucesso, o maior deles é o sorriso de uma criança. E não é a mesma coisa se alguém contar; é preciso ver com os próprios olhos. Mas temos muitos outros programas, como o Programa de Preparação para o Trabalho. Os funcionários da empresa recebem os jovens aqui na matriz e dão dicas de como preparar um currículo, como se portar numa entrevista, palestras sobre empregabilidade. No mês passado tivemos um evento desses. Os meninos e meninas adoraram e os colaboradores também! Só para você ter uma idéia, algumas das crianças vieram de gravata! Muitos deles nunca tinham saído do Campo Limpo, como eu. Nunca vou me esquecer de um garoto que, mesmo diante das dificuldades de um lar desestruturado, encheu a boca para dizer: “Eu quero e vou ser advogado”. Por isso quero intensificar essas visitas, ampliar o Programa Jovens Aprendizes.
Que dicas daria ao empresariado quando falamos de Responsabilidade Socioambiental? Precisamos nos questionar mais, promover provocações para mudanças efetivas no mundo. Com relação ao mercado de limpeza e conservação especificamente, posso citar alguns pontos: contratação responsável dos fornecedores, compra ética de produtos químicos e de qualidade, além do social com relação aos funcionários e clientes; no ambiental: utilizar os recursos naturais com consciência. Vale a pena olhar a Cartilha do Instituto Ethos, que fala de indicadores. São perguntas sobre qualidade de vida. É uma ótima fotografia da empresa – um mapeamento feito por um órgão externo, idôneo. A comunicação é outro item importante: o que você apresenta para a comunidade é realmente aquilo que você executa? Você compraria o seu produto/serviço? Para uma empresa que está entrando neste movimento agora, que leve a questão com a seriedade necessária. E digo mais: este é um momento de maturidade, de transição. Existem empresas, sim, que enxergam esse movimento como um modismo ou como uma maneira de ganhar dinheiro. Mas há também muitas que trabalham de forma séria. É uma mudança que depende da cultura, dos valores, de muitas pessoas dentro da mesma empresa. E é uma questão de sobrevivência. Quem pensa que o mundo vai acabar está muito enganado. A natureza é sábia. Quem vai deixar de existir vai ser o ser humano, se não mudarmos essa realidade do consumo desenfreado, das comunidades que não vêem perspectivas de mais qualidade de vida. O nosso papel, individual, é fundamental, é parte de um movimento maior. E a sociedade já cobra essas ações das empresas.
Para finalizar, conte um momento que fez essa trajetória ter valido a pena, e que justifica continuar.
Em uma dessas visitas ao Campo Limpo, encontrei uma garotinha que me disse: “Tio, vou falar para os meus pais de você. Meu ídolo não é mais aquele ator da novela, é você. Porque me trouxe uma coisa que eles nunca vão me trazer: a esperança de poder sonhar”. O sonho do Fábio é então (mesmo que possa parecer uma utopia) que todos tenham a sensibilidade de acordar e ver que o caminho que a gente está seguindo não é o correto. Que trabalhar 12 horas por dia não é normal. Que essa competitividade não é sadia. Ou se perguntar: por que precisamos tanto de um carro e até mais do que um. Como fazer isso? Promover esses trabalhos de “formiguinha”, e acreditar que um menino da periferia pode ser uma pessoa honesta, um profissional realizado, sem perder o mesmo brilho no olhar, da satisfação interior, que nenhum dinheiro compra.
Projetos
Ações de Sensibilização e envolvimento dos profissionais da empresa
- Participação da criação do link de sustentabilidade no Portal Corporativo para divulgação de informações importantes sobre o tema.
- Coordenação do projeto de disseminação do tema da responsabilidade social empresarial por meio de discussão dos Indicadores Ethos, envolvendo funcionários de diferentes áreas e níveis profissionais divididos nos sete grupos dos Indicadores.
- Palestras sobre sustentabilidade para novos funcionários no Programa de Ambientação e eventos de sensibilização reuniões com temas gerais.
- Participação da criação do blog de Sustentabilidade, espaço dedicado ao tema no Portal Corporativo, criando mais um canal de diálogo com os profissionais.
Capacitação sobre Sustentabilidade
- Coordenador do projeto de capacitação do Curso de Auditor Interno da Norma SA 8000 para profissionais das áreas de relações humanas, jurídico, suprimentos, administração e SMS e do Treinamento em Legislação Ambiental.
Investimento Social Privado e Voluntariado
- Coordenador do Programa de Voluntariado: reconhecer, incentivar e promover o trabalho voluntário entre profissionais, prestadores de serviço e aposentados.
- Representa a empresa no Comitê Brasileiro do Pacto Global, grupo que coordena as ações do Pacto no Brasil.
- Coordenação de eventos que recebem grupos de jovens oriundos dos projetos sociais que a empresa apóia para demonstrar o cotidiano da empresa e também incentivar a troca de experiência entre os jovens e os profissionais da organização onde atua.
- Criador e coordenador do blog de Voluntariado, espaço dedicado ao tema, criando um canal de diálogo com os profissionais, os prestadores de serviço e os profissionais aposentados participantes do Programa.
Fornecedores
- Participação no processo de inserção de critérios específicos de responsabilidade social, como proibição do trabalho infantil, relações de trabalho adequadas e adoção de padrões ambientais nas políticas de seleção e avaliação de fornecedores.
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